Retrospectiva Cecilia Mangini
Cecilia Mangini é uma das mais importantes realizadoras italianas, pioneira no cinema documental do pós-Guerra. Nasce em 1927, no Sul da Itália, território para onde volta o seu olhar várias vezes ao longo da carreira. Com uma filmografia que abarca sete décadas, Mangini mantém uma visão comprometida, atenta e íntima com o indivíduo e a sociedade. Os seus filmes exploram temas urgentes, como a condição da mulher, as raízes do fascismo, a imigração ou a injustiça social. Falecida no início deste ano, a força e a beleza do trabalho de Mangini perduram não só nos filmes que assinou mas também nas várias obras que criou em colaboração com outros artistas, como Lino Del Fra ou Pier Paolo Pasolini. A história de uma vida dedicada a pensar o cinema como uma ferramenta de resistência.
A retrospectiva contará com a presença dos realizadores Mariangela Barbanente e Paolo Pisanelli. O programa inclui a estreia internacional do filme póstumo de Mangini, co-realizado com Pisanelli, The World in Shots.
Mangini, Del Fra e Mingozzi, inspirados pela investigação do etnólogo Ernesto de Martino, filmam as culturas do Sul de Itália com as práticas tradicionais e os rituais mágicos que nessas regiões sobreviviam. O género do documentário etnográfico é desafiado, explorando as suas fronteiras estéticas e políticas. Em Divine Love, acompanhada pela música de vanguarda de Egisto Macchi, Cecilia Mangini descreve-nos um culto religioso no centro de Itália.
Na década de 1960, a Itália sofria profundas convulsões económicas, políticas e sociais. Com a industrialização, o “boom económico” e o consumo em massa, entram também em campo as migrações internas. Paralelamente às lutas da crescente classe operária, as estruturas familiares e os papéis de género começam a ser questionados. Mangini e Del Fra observam por perto estas movimentações, as públicas e as íntimas.
Diferentes visões de Itália ao longo da história: um território móvel, em transformação. Do Risorgimento, processo de unificação no século XIX, a Trieste depois da libertação do regime fascista. Retrato de Florença pelas palavras do escritor neo-realista Vasco Pratolini e uma nova auto-estrada que irá cruzar a ilha da Sardenha de norte a sul. Convulsões e revoluções, sociais, políticas e económicas.
Na Itália dos anos 1960, dá-se um rápido desenvolvimento industrial apelidado deil boom economico. Milhares de pessoas tentam aproveitar e escapar de uma vida de miséria e fome. Fata Morgana é o comboio que chega a Milão, vindo do Sul da Itália, cheio de migrantes à procura de trabalho. Com Domani vincerò Mangini aproxima-se da vivência dos migrantes e investiga como o boxe passou a ser uma possibilidade de libertação social para os jovens.
Mangini explora a ligação entre o desporto e a construção de comunidades. Em Dalla ciliegia al lambrusco, descobrimos o “caminho popular de Vignola”, uma corrida não-competitiva que desafia as retóricas da competição. Em L’altra faccia del pallone, acompanhamos a construção de um complexo desportivo público, ferramenta de liberdade e emancipação.
The Chant of Tiber’s Branches e The City’s Unknown (o primeiro filme de Mangini) utilizam as palavras de Pier Paolo Pasolini como guias para a explosão de energia e revolta da juventude que habita as periferias de Roma. Vinte anos depois de Comizi d’amore, de Pasolini, Cecilia Mangini e Lino Del Fra voltam a investigar o que os italianos pensam sobre sexo, família e género. Primeiro episódio, sobre a relação dos jovens com estes temas.
Em Happy Christmas, Cecilia Mangini denuncia, com ironia e enorme clarividência, a falsa mitologia do consumo de bens de massa e artigos de moda. É seguido pelo segundo episódio da série inspirada em Comizi d’amorede Pasolini. Desta vez, os italianos são confrontados com perguntas difíceis sobre sexo antes do casamento, casos extraconjugais e homossexualidade.
Uma criança dos subúrbios de Roma foi considerada desajustada pelos pais e pela escola. Através desta história, Mangini propõe uma reflexão sobre o conformismo e a opressão da autoridade. Segue-se o último episódio de Comizi d’amore ‘80 que investiga o que os italianos pensam sobre sexo e género. Agora, as perguntas são sobre pudor e casamento.