Tomás Baltazar entrevista Rania Stephan

Rania Stephan é realizadora de In Fields of Words: Conversations with Samar Yazbek.

 

 

As palavras de Samar Yazbek transportam imagens. De que modo essas imagens contribuem para uma estrutura tão vívida e orgânica no filme?

A primeira vez que li um texto de Samar Yazbek, fiquei impressionada com sua capacidade de escrever com imagens, numa língua árabe renovada e de modo contemporâneo. Eram como um filme, e foi isso que me interessou na sua escrita. Era importante começar o filme com essa afirmação essencial sobre a forma como escreve. Essa ideia deu-me liberdade para pintar algumas dessas imagens e explorar a pontuação como elemento essencial para construir a minha narrativa, tal como o som, a música, o texto e o arquivo.

 

Ao ver este filme, há uma deambulação, um passeio musical, momentos de descanso entre o texto e a palavra escrita e a fala de Samar Yazbek. Tudo isso é estruturado por um tom musical, quase operístico. Como chegaste a esta simbiose entre som e imagem?

Queria que o espectador experienciasse diferentes registos das relações com as palavras: ouvir, ler, ouvir literatura. A música que escolho vem sobretudo de compositoras pioneiras da música eletrónica, que trabalharam com computadores e instrumentos analógicos. Sinto-me muito próxima dessa abordagem, usando ferramentas analógicas e digitais. Gosto de seguir as camadas de imagem e som, não apagando as suas origens. O filme foi construído de uma forma em que imagem, som, música, palavras e textos ressoassem e se entrelaçassem como uma ópera visual.

 

Samar Yazbek conta que, nos últimos 5 anos, a sua relação com a morte e com as palavras mudou. Após trabalhar neste filme, até que ponto a tua própria relação com a morte e as imagens foi impactada?

Iniciámos estas conversas filmadas em 2013. O filme levou quase 10 anos a fazer. Nessa década, as nossas vidas mudaram totalmente, o Líbano entrou em colapso, a Síria desapareceu, de certo modo… O filme é uma sobrevivência milagrosa desse caos. Mas o novo romance de Samar será lançado em breve e o filme será projectado em grande ecrã em Lisboa. Apesar de vivermos tempos conturbados, rodeados de morte e turbulência, conseguimos fazer cinema e literatura. Por isso, de certo modo, não sei; ainda há luz nesta escuridão.