Riscos

Ana Carolina Teixeira Soares, também conhecida como Ana Carolina, é uma das autoras mais marcantes do cinema brasileiro com uma filmografia diversa e acutilante entre a ficção e o documentário. O Doclisboa apresenta o seu último filme, Paixões Recorrentes, e a sua primeira longa-metragem, Getúlio Vargas. Com quase 50 anos de diferença, os dois filmes dissecam a sua contemporaneidade, traçando uma linha crítica entre o passado e o presente do Brasil.

Cientista político qualificado e assíduo do Doclisboa desde que a sua primeira longa ganhou o Prémio Especial do Júri em 2012, a prática deste cineasta e artista baseia-se na investigação e emprega política e poética para confrontar as estruturas de poder e relações do mundo através de um cinema que explora a – e é criado na – intersecção da realidade com a sua documentação. Baudelaire apresenta os seus dois últimos filmes e uma obra de Louis Malle.

Em 2015, o Doclisboa organizou a primeira retrospectiva integral de Želimir Žilnik, figura chave da Vaga Negra jugoslava. Estas quatro curtas-metragens, feitas entre 1973 e 1975 na Alemanha Ocidental, foram consideradas perdidas e, como tal, não exibidas. Deu-se o milagre: foram recentemente descobertas tal como o material da sua segunda longa, Freedom or Cartoons. Journal About Želimir Žilnik acompanha os esforços para acabar o filme cinquenta anos depois.

A humanidade molda-se em torno de duas noções, a permanência e o fluxo. Na permanência avassaladora há sempre algo que flui e no fluxo inevitável há sempre algo que permanece. É nessa ruptura no tempo e no espaço que surgem os fantasmas, que são mudanças desconhecidas, segredos em aberto pelos quais se escapam as histórias. Filmes que se questionam sobre o que fica e o que desaparece, o que se lembra e o que se esquece, o que se procura e o que se encontra.

Outrora montadora de Agnès Varda, Patricia Mazuy é agora uma mestre singular do cinema contemporâneo que faz filmes de género com uma arte e inteligência únicas. Em Before Saturn, Laurent Achard acompanha-a na fase de preparação do novo thriller, Saturn Bowling. Mazuy encena o bowling clandestino, palco principal de luta entre dois irmãos no mundo da noite. Como imaginar o universo inteiro e, depois, fazer um filme a partir disso?

Abarcar o nosso tempo é um contínuo processo de tentativa e erro. Há uma nova série infantil. É uma adaptação d’A Metamorfose de Kafka e a imagética colorida é tão exagerada que a noção de infância está grotescamente desconexa. No YouTube, há um humorista a tentar brincar com a guerra e o som das raves e dos furacões que abalam a Terra também lá está. São muitas as vozes que tentam explicar o mundo – os narradores proliferam e as narrativas também.

Três odes a uma arte solitária que transformam a nossa casa numa fábrica de sonhos e imaginação. Em Me and Ma and Everything and Nothing, Sasha Pirker reflecte sobre o conceito de espaço negativo, acompanhando a Lua com vários sons. Fatima, de Bruno Sukrow, é um conto de fadas sobre a bailarina e os seus raptores. Francis Brou, em The World Mutates, partilha os pensamentos de um homem que vive no seu estúdio, desligado de qualquer ambiente social.

O desejo habita o paradoxo da ficção por ser sobretudo imaginado, uma projecção em algo ou alguém. É projectado sobre imagens, filmes, livros ou até em alguém que apenas vislumbramos na escuridão. Este programa assenta em filmes que exploram a maneira como o erotismo e a sexualidade foram representados no cinema e na literatura, mas é também uma meditação sobre a forma como a fantasia erótica se situa na fronteira esbatida entre ficção e realidade.

Eight Deadly Shots, filmado por Mikko Niskanen em 1972, é considerado por muitos (incluindo Aki Kaurismäki) o melhor filme finlandês de sempre. Graças aos esforços de Peter von Bagh e Martin Scorsese, pode ser finalmente visto fora do seu país de origem. The Story of Mikko Niskanen é um trabalho de amor e de muitos anos do próprio von Bagh, “um homem da Renascença”, que perscruta a alma do realizador e as suas obras com grande intensidade e ardor.

Sasaki Yusuke muda-se para Tottori, a província com menor população do Japão. Sabendo haver apenas três salas de cinema em toda a região, inicia uma busca por aqueles que adoram ver cinema. Nesta jornada emocionante, são surpreendentemente muitos os grupos e organizações com que se cruza e que nos contam as formas como as suas noções de comunidade se fortalecem numa profunda relação com o ver cinema colectivamente. O cinema está vivo e a cinefilia também.